BRASILEIRO POR
OPÇÃO-XVI
José Augusto de Castro e Costa
O Coronel Rodrigo de Carvalho, no
então cenário acreano, não seria apenas um extremado revolucionário, ainda que
teoricamente, mas era um elemento precioso de êxito, mesmo sem contar com sua
função de alto funcionário do governo amazonense.
Fora através de sua simpatia que
ele servira-se para subornar um brasileiro, funcionário da Delegação Boliviana
para obter todas as informações e até particularidades oficiais das autoridades
de Puerto Alonso, ao longo dos dois anos do domínio da Bolívia.
Corria a metade do ano de 1902,
quando aos seringais chegara a preocupante notícia de que a Bolívia arrendara
toda a região acreana a uma empresa estrangeira, o "Bolivian
Syndicate".
Todos sentiram o pavor da presença
da aliança que vinha de fazer o invasor, colocando a seu lado o
imperialismo americano para disputar o território brasileiro, de onde saiam os
capitais para a exploração comercial que pretendiam os estrangeiros.
Foi então que surgiu, dos
bastidores das tentativas revolucionárias, a figura empolgante de José Plácido
de Castro, um gaúcho que àquela região chegara há uns dois anos antes,
estimulado pelo convite de dois conterrâneos, Gentil Norberto e Orlando Lopes.
Há muito que Plácido de Castro
considerava que a presença das autoridades bolivianas, alí instaladas com o
consentimento prévio do governo brasileiro e pela força das armas impondo´se à
população acreana, afigurava-se uma afronta à Nação, um atentado inominável à
integridade da pátria.
Os acontecimentos que presenciara
ao longo do rio Acre, Purus e Iaco viriam tornar apreensível sua alma
patriótica, clamando uma reparação. O arrendamento daquelas terras, por fim,
apresentara-se como um grande perigo à ordem política continental e à prórpria
integridade do Brasil.
No exercício da profissão de
agrimensor, munido da indispensável provisão, achava-se Plácido de Castro
demarcando o o seringal "Vitória", de propriedade de José Galdino.
Testemunhara que os bolivianos haviam elevado à categporia de Vila o povoado de
Xapurí, com o nome de Antonio Antunes de Alencar, que alí gozava de algum
prestígio e que envidara esforços para conciliar os brasileiros com os
bolivianos, em parte conseguindo, tanto que se fez eleger intendente
conjuntamente com o Dr. Magalhães. Continuava, entretanto, o desgosto dos
brasileiros, sobretudo devido aos rumores que lá chegaram do arrendamento do
Acre a uma companhia estrangeira.
Precisamente em 23 junho de 1902
chegaram às mãos de Plácido de Castro alguns jornais que noticiavam como
definitivo o arrendamento do território acreano e estampavam o teor do
contrato, então firmado entre a Bolívia e o "Bolivian Syndicate".
Plácido de Castro considerou a matéria como uma completa espoliação feita aos
acreanos, aos quais obviamente sentira-se incluído. Veio-lhe à mente a idéia
cruel de que a Pátria Brasileira iria-se desmembrar, pressentindo que
aquilo era o caminho que os Estados Unidos abriam para futuros planos, forçando
o Brasil desde então a lhes franquear à navegação os nossos rios, inclusive o
Acre. Qualquer resistência ensejaria aos poderosos americanos o emprego da
força e a desgraça nacional em breve estaria consumada.
Plácido de Castro guardou,
apressado a bússula de Casella, de que se estava servindo, abandonou as balisas
e demais utensílios e saiu no mesmo dia para a margem do rio Acre.
Lembrara-se do apelo que lho fizera Rodrigo de Carvalho, anteriormente,
ainda em Manaus, após o fracasso da Expedição dos Poetas, tendo ele protelado.
Há algum termpo, prevendo esse
comportamento, houvera ele falado a vários proprietários na possibilidade de
uma resistência, consultando-os se com eles poderia contar.
Segundo o Caudilho, de todos foi o
coronel José Galdino, incontestavelmente, quem demonstrou melhores disposições
de auxiliá-lo. Com ele combinou em que a revolução se faria: Plácido
desceria até "Caquetá", concitando a luta os demais proprietários,
devendo romper o movimento em "Bom Destino", seringal de propriedade
de Joaquim Victor da Silva, um grande entusiasta da revolução e a pessoa de
maior prestígio no baixo Acre. Nessa conformidade Plácido desceu a 25 de junho
de 1902 de "Vitória", em uma canoa de José Galdino, passou a 29 em
"Bagaço" e a 30 chegou a "Bom Destino".
Depois de entender-se com o
coronel Joaquim Victor, que, segundo o Caudilho, foi o acreano que
maiores sacrifícios pecuniários fez pela revulução, ficara acertado descerem
até "Caquetá", onde se achara o diretor da Mesa de Rendas do Estado
do Amazonas, Rodrigo de Carvalho, o qual proclamava lhe haver o governador
Silvério Nery, remetido grande quantidade de armamentos com destino à
revolução.
Em "Caquetá", no dia 2
de julho de 1902, em reunião que contava com as presenças de mais
adeptos, trataram tão-somente da revolução e, por proposta de Plácido, ficara
assentado em que seria formado uma junta revolucionária composta dos coronéis
Joaquim Victor da Silva, José Galdino de Assis Marinho e Rodrigo de Carvalho, e
que, rompendo as hostilidades a mesma ficaria automaticamente extinta, para que
só ficasse em ação uma única autoridade - o comandante-chefe, no caso Plácido
de Castro.
Plácido não conseguiu apoio para
que a revolução rompesse no baixo Acre, como desejava, ficando assentado
que o movimento romperia em Xapurí. Tendo para alí regressado, o Caudilho não
tinha certeza do êxito da revolução, de vez que todos declaravm
empenhar o melho de sí, mas ninguém quereria ser o primeiro.
A 4 de agosto era a primeira
segunda-feira do mês e, segundo superstição local, os acreanos consideravam dia
asiago. Como um dos seus remadores dissera-lhe que não trabalharia, por ser a
primeira segunda-feira de agosto, e poderia haver algum desastre, Plácido puxou
o revólver e falou em alto e bom tom: "Se trabalhares, pode
ser que te aconteça algum desastre, mas se não trabalhares é certo que morrerás
já" - e com um tiro n'água indicou-lhe o caminho a seguir.
O homem que parecera firmemente a
não movimentar-se, rompeu imediatamente em marcha.
Às 22 horas, em meio de profunda
escuridão estavam passando em frente à povoação de Xapurí, sem serem
percebidos, pois Plácido teve o cuidado de advertir de que não fizessem
barulho com os remos na borda da canoa. O velho canoeiro, ainda aí se
portara mal, obrigando o Caudilho a fazê-lo compreender que, se fossem
descoberto, ele perderia a vida no mesmo instante.
Ao passar pela povoação Plácido
mandou por terra um homem a "Vitória" comunicar ao coronel José
Galdino que estava indo por água e que ele deveria reunir imediatamente todo
seu pessoal, pois, conforme ficara assentado, aquela hora todo o baixo Acre
deveria estar conflagrado.
O mensageiro chegou à
"Vitória" na mesma noite, enquanto Plácido, somente no dia seguinte,
às 9 horas da manhã, aparentando uma alegria e, em bom humor, dizendo que a
revolução não duraria 20 dias, pois achara que o entusiasmo no baixo Acre era imenso.
O coronel Galdino mandou
efetivamente reunir o seu pessoal, conseguindo o comparecimento de 33 homens,
inclusive seu filho Matoso.
Com esses 33 homens, ao cerrar da
noite, seguiram em canoas para Xapurí, onde chegaram às 5 horas da manhã,
quando vinha rompendo a aurora.
Era 6 de agosto, sem que soubessem
os revolucionários, dia comemorativo à independência da Bolívia, pelo que
estava preparada uma grande festa. Na véspera as autoridades bolivianas haviam
dormido muito tarde, depois de abundantes libações e dos cânticos patrióticos
do costume, pelo que àquela hora da manhã dormiam ainda a sono solto.
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