BRASILEIRO POR OPÇÃO-XXII
José Augusto de Castro e Costa
Plácido de Castro, ao longo do mês de abril de 1903, passara
a sentir-se incomodado ante as notícias de estranhos acontecimentos que
vinham-se seguindo, o que, por certo, agravariam a conotação de seus maus
pressentimentos.
Toda espécie de picuinhas e perseguições o Caudilho vira
mover-se contra ele, oriundas de alguns de seus próprios patrícios e de
graduados militares do Batalhão do
Exército.
Numa tarde da primeira quinzena de maio, ao chegar ao
seringal “Iracema” com seus fiéis soldados, Plácido se propusera a tomar,
juntamente com os seus companheiros, o destino que a situação excepcional o
aconselhasse, convicto, porém, de que “quem se tinha assim sacrificado pela
Pátria, jamais se deixaria enxovalhar”.
Plácido de Castro sentira o momento de filosofar sobre as
circunstâncias que o Acre passara a
vivenciar, assistindo o representante
militar do governo brasileiro transgredir os limites da missão que lhe fora traçada, vendo
a ocupação do Acre Setentrional e a
invasão do Acre Meridional, sentindo a prisão com brutalidade do
ajudante-general do Exército Acreano e
demais soldados, sendo informado da posse violenta e confisco do “Independência”
e de milhares de mercadorias, móveis e utensílios...Um turbilhão de fatos
negativos aos propósitos do Caudilho tomavam corpo e tumultuavam suas
perspectivas.
Precisamente no dia 12
de maio, Plácido de Castro fora avisado da chegada ao porto do “Iracema”, local
em que se encontrava no momento, de uma lancha do
Quartel-General do exército brasileiro,
trazendo um emissário que viera convocá-lo para uma conferência com o General
Olímpio da Silveira.
Plácido, com inabalável solicitude, respondera, mandando
dizer ao General que a tal conferência não teria mais sentido, em face de haver decidido que, a
partir daquele momento, sua carreira militar e política estaria encerrada, com
sua forçada deposição. Portanto, de posse da convocação do General, não
aceitaria a conferência e nem se deixaria desfeitear.
Após a partida da lancha do Quartel-General, o Caudilho recolhera-se para redigir a Ordem do Dia, com
a qual, dirigindo-se aos que tiveram a nobreza para enfrentar todos os
sofrimentos com constância e altivez, relatara os últimos acontecimentos
vivenciados desde a chegada do Exército Nacional e deliberara dissolver o
Exército Acreano, encerrando o expediente com a afirmação de que “aquilo que o inimigo não
conseguiu fazer pelas armas, o general brasileiro alcançou pela traição.
E os nossos algozes são aqueles que oficialmente estão
incumbidos de zelar pela nossa liberdade e pela honra da Pátria”.
Ao redigir a Ordem do Dia, Plácido refletira que bem poderia
resistir àquela perturbação desenfreada, àquela anarquia que somente se
justificaria pela insanidade, pela prepotência, pelo desequilíbrio emocional.
O bom senso e equilíbrio do Caudilho, porém, o detiveram de
uma reação violenta contra as forças de sua própria pátria, conduta que o
conduzira a protestar contra o atentado inominável e retirar-se altivamente do
território, para levar, pessoalmente, suas reclamações ao governo federal. E
assim o fizera.
Com a divulgação dos recentes acontecimentos e graça a essa
providencia, Plácido fora nacionalmente aclamado, em delirantes manifestações
de reconhecimento e entusiasmo patriótico, tanto em Manaus quanto no Rio de
Janeiro. Por extensão, o governo federal
acolhera-o condignamente, oferecendo-lhe completas satisfações e
determinando seu retorno para o Acre Meridional, em caráter oficial.
Em consequência das tresloucadas atitudes, o general Olímpio
da Silveira sofrera demissão e fora severamente censurado “pela autoria do delito de assaltar uma praça
de guerra livre, onde o Brasil não tinha soberania e sim intervenção
diplomática”.
Para substituir o autoritário e desequilibrado oficial, fora
nomeado o Coronel Rafael Augusto da Cunha Matos, a quem foram transmitidas
ordens terminantes de, em Ordem do Dia, protestar “contra o ato inoportuno e impolítico de seu antecessor”, e de reparar tudo, inclusive a reorganização do
exército acreano desbaratado.
Após aguardar o desenrolar dos acontecimentos em Manaus, onde
permanecera por três meses, Plácido de Castro conferenciara com o novo Comandante do 1º Distrito Militar
de Manaus, general Luis Antonio de Medeiros, ocasião em que tomara conhecimento
e entrosara-se com o esquema da nova
política brasileira, ênfase do programa de governo do Presidente Rodrigues Alves.
O Caudilho da revolução acreana sentira bastante com a
humilhação sofrida na desavença com o general-comandante da Expedição Norte,
razão pela qual confiara na reparação que os telegramas recebidos do Ministério
do Exterior lhe anunciavam.
Durante os contatos mantidos com as autoridades militares
sediadas em Manaus, o chefe revolucionário acreano inteirara-se do desenrolar
dos últimos acontecimentos relacionados à região acreana e, enfim prestigiado, sentira-se glorificado e de alma
lavada e enlevada com a publicação do Decreto nº 1, do Comando
Militar Interino do Acre Setentrional e Comando em Chefe das Forças de Ocupação, nos
seguintes termos:
“Governo Militar Interino do Acre Setentrional e Comando em
Chefe das Forças de Ocupação. Quartel-General na Praça da Empresa, 3 de agosto
de 1903.
DECRETO N° 1
O coronel Rafael Augusto da Cunha Matos, governador Militar e
comandante-em chefe,
CONSIDERANDO que o ato do seu ilustre antecessor, o
General-de-Divisão Antonio Olímpio da Silveira, desarmando e licenciando as
forças acreanas que sob o comando do Sr. Coronel Plácido de Castro ocupavam
militarmente o Território Meridional, foi antipolítico, menos conveniente e
inoportuno;
CONSIDERANDO também que a apreensão de artigos bélicos,
material flutuante e gêneros alimentícios pertencentes às mesmas Forças que os
adquiriram com os sacrifícios de preciosas vidas de centenas de valentes
brasileiros tombados em mais de uma ação de combates travados em defesa do solo
nacional, foi indevida;
CONSIDERANDO finalmente que não podem nem devem continuar de
pé as aludidas deliberações,
RESOLVE:
Chamar às armas as Forças dissolvidas que deverão as
apresentar aos respectivos chefes. Restituir às mesmas Forças o que
indevidamente foi apreendido e finalmente, reconhecer e manter no governo do
Território Meridional do Acre e no Comando em Chefe das mesmas Forças Acreanas,
o Sr. Coronel Plácido de Castro.
Rafael
Augusto da Cunha Matos
Coronel Governador.
Em face da campanha acreana, Plácido de Castro encontrara a
prova de reconhecimento dos brasileiros, vindo através de manifestações
generalizadas das classes conservadoras, da Imprensa, das Forças Armadas, do
governo, do clero, do povo, destacando-se discursos inflamados de entusiasmo em
festa cívica no Teatro Amazonas, estendendo-se até a sermão solene em Missa
campal.
No final de agosto de
1903 o Caudilho, certificado pelo novo comandante local acerca da indenização dos prejuízos causados pela
captura dos bens materiais e provisões de sua força revolucionária e, ainda,
recuperado de todos os seus títulos e prerrogativas, retornara à região acreana, oficialmente, na qualidade
de governador do Acre Meridional - ou do Estado Independente do Acre.
O panorama político tranquilizara-se
porque o Brasil, com a posse do novo presidente Rodrigues Alves, passara a
adotar uma avançada mentalidade em seu
programa de governo, instaurando uma política destinada a fomentar o pleno
desenvolvimento de todas as potencialidades do país, tais como a balança
comercial, os meios de transportes, a saúde, a educação, a transformação do
velho Rio de Janeiro numa das mais belas metrópoles do continente e também a diplomacia, onde se
destacaria a figura de José Maria da Silva Paranhos – Barão do Rio Branco.
Aos cinquenta e oito anos de idade, o Barão do Rio Branco já
acumulara em sua bagagem, uma inestimável folha de serviços prestados
diretamente à diplomacia brasileira, onde destacaram-se o desempenho rotineiro
de suas funções pacíficas exercidas nos movimentados postos dos Continentes
americano e europeu, até a admirável habilidade para vencer as encrencadas
complicações de Missões, no Rio Grande do Sul e do Amapá, no extremo norte do Brasil.
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