sexta-feira, 28 de dezembro de 2012


BRASILEIRO POR OPÇÃO-XXVI

                        José Augusto de Castro e Costa

Com o assassinato de Plácido de Castro, a intranquilidade assolara de vez as plagas acreanas, sobressaltando a todos, ante o regime de violências, com o fim de instigar os seringueiros contra os patrões.

Nessa política de conturbação generalizada, os gerentes de seringais não tinham, naturalmente sobre o seu pessoal, a mesma ascendência que o dono, o que propiciava a rebeldia de ambiciosos “aviados”, pequenos comerciantes, que dispunham de muitos seringueiros, com quem trabalhavam por conta própria, supridos pelo barracão de que eram fregueses, e em parte locatários.

Em francas e constantes desavenças, alguns seringueiros (capangas), instigados, escondidos atrás de “sapopemas” de enormes samaúmas, emboscavam, fatalmente, os gerentes ou donos de seringais.

Havia fase em que o sentimento de segurança e tranquilidade consolidava-se e parecia permanecer por algum tempo, porém, logo o sintoma da desestabilização manifestava-se, levando autoridades a abandonar seus postos, a exemplo do Juiz de Direito, Dr. João Rodrigues do Lago e, a seguir, o Juiz Preparador, Dr. Silvio Gentil de Lima, que, igualmente ameaçado de morte, também tivera que desertar, indo relatar minuciosamente os fatos ao Presidente da República, Nilo Peçanha.

Dizem que em face de tanta coação, passara a reinar no Acre a “paz de Varsóvia”. Era sob essa opressão psicológica e física que se encontrava a terra acreana. A própria história do assassínio de Plácido de Castro era contada em segredo.

Quando se esperava um desafogo geral com o advento de um novo Prefeito , eis que agravava-se ainda mais a situação, com a medida de algum militar, quando entendia de revigorar o regime de violência, provocando o renascimento de discórdias entre prefeito e militares e seringueiros e autonomistas.Era de se supor que o procedimento do grupo autonomista do Alto Acre, não secundando o movimento verificado nos outros dois Departamentos, tranquilizasse as autoridades federais, quanto à manutenção ali da ordem pública. Parece, entretanto, que essa atitude incrementara as desconfianças e temores dos agentes do governo em todos os Departamentos acreanos, onde a turbulência política era uma constante, e generalizada era a discórdia.

Os militares reforçavam as medidas de precaução na defesa de sua Companhia Regional. Mais receoso e menos controlado, o Prefeito passava a hostilizar os principais elementos autonomistas, afastando dos cargos administrativos os poucos que os ocupavam, e cercando-se do grupo de adventícios, intrigantes e bajuladores, que iludiam a confiança e exploravam os favores de todos os prefeitos.

Segue-se nesse impasse até 1920, quando, pelo Decreto nº14.383, de 1º de outubro, o governo federal unificou a administração do território, o qual passou a ser dirigido por um Governador, tendo sido nomeado para exercer a elevada função, o  médico Epaminondas Jácome, militante ativo em prol da autonomia desde 1909, e membro do Clube Político “24 de Janeiro”, presidido pelo coronel  Antonio Antunes Alencar, um remanescente revolucionário.

Ao Governador Epaminondas Jácome competiu organizar a estrutura administrativa do território, no período de 1920 a 1923, cabendo aos seus dois sucessores apenas, ao que se sabe, custodiar os recursos financeiros.

O quarto governador do Acre, porém, o advogado Hugo Ribeiro Carneiro, firmou sua capacidade administrativa, ao concretizar, no período de 1927 a 1930, as primeiras edificações em alvenaria, tais como o atual Palácio Rio Branco, sede do governo, o Mercado Municipal, os três pavilhões do atual Quartel da Polícia Militar, a instalação da primeira agência do Banco do Brasil no Acre, a construção da primeira Maternidade em Xapurí, além de ativar o exercício da Instrução Pública, instituindo,no “curriculum” escolar, a aplicação de disciplinas relacionadas às atividades cívicas, artísticas e conhecimentos gerais, impondo, como costumava dizer, o uso do “uniforme que pôs termo aos excessos e inconvenientes da moda no Acre”.

Depois de vivenciar as crises diplomáticas e políticas, vira-se o Acre envolvido com a crise constitucional, quando a Constituição Brasileira de 16.7.1934, preceituara em seu artigo 16, § 1º, que ”logo que tiver 300.000 habitantes e recursos suficientes para a manutenção dos serviços públicos, o território poderá ser, por lei especial, erigido em Estado”, e em seu §3º, do mesmo artigo, “o território do Acre será organizado sob o regime de Prefeituras autônomas, mantida, porém, a unidade administrativa territorial, por intermédio de um delegado da União, sendo prévia e equitativamente distribuídas as verbas destinadas à administração local e geral”.

Fora porém o décimo primeiro  governador, José Guiomard dos Santos, quem dera ao Acre, de 1946 a 1950, os méritos almejados por aqueles que lutaram pela terra que aprenderam a amar, transmitindo-lhes um sonhado sentimento de segurança e tranquilidade.

Mineiro de Perdigão, era o Major Guiomard dotado de certa experiência, adquirida no período de 1940 a 1943, quando exercera o cargo de Governador do Território Federal de Ponta Porã.

No Acre, o governador Guiomard dera ênfase à sua administração, promovendo a modernidade do Território, ao pavimentar suas ruas, utilizando tijolos, em vista da completa ausência de pedras no solo acreano. Para facilitar suas visitas aos demais municípios, em número de seis, além da capital, foram adquiridas sete lanchas modernas, com acomodações para seis passageiros, em três camarotes com beliches, distinguindo, cada uma, com a denominação da respectiva sede: Rio Branco, Xapurí, Brasiléia, Sena Madureira, Feijó, Tarauacá e Cruzeiro do Sul.

Eram destaques do governo a conclusão de obras até então inacabadas, como escolas públicas e hospitais, e a implantação das primeiras monoculturas, levadas a efeito em locais devidamente inaugurados, na capital acreana, para os respectivos fins, como a Fazenda Sobral, a Estação Experimental e o Aviário.

 Em junho de 1954, o então Deputado José Guiomard dos Santos, líder do PSD acreano, apresentara à Câmara dos Deputados o projeto destinado a elevar o Território do Acre à categoria de Estado, pleito que se tornou uma constante até sua concretização, oito anos depois.

Por essa época, no Acre, destacavam-se dois partidos: O PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), liderado pelo Deputado General Oscar Passos e o PSD (Partido Social Democrático), comandado pelo Deputado General José Guiomard dos Santos. Ambos, contemporâneos desde a Academia Militar, haviam governado o Território do Acre, cabendo ao então Major Oscar Passos, o nono a ser nomeado, exercer a administração acreana por um curto período, de 30 de agosto de 1941 a 22 de agosto de 1942.

Em 7 de setembro de 1961, dada a renúncia de Janio Quadros, assumira a Presidência da República o Vice-Presidente João Goulart, do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), opositor ao PSD, a que pertencia o Deputado José Guiomard dos Santos.

Em 29 de outubro de 1961,fora nomeado o 22º governador do Acre, o petebista, Engenheiro Agrônomo José Ruy da Silveira Lino, acreano de Tarauacá que, na sequência, viria a ser o último Delegado da União no Território.

Um dos principais pleitos do Governador Ruy Lino era com vistas ao bem estar social dos funcionários do governo que, desde os primórdios da administração acreana, não possuíam a menor estabilidade empregatícia, nem direitos a quaisquer benefícios que os demais funcionários brasileiros já possuíam, sobretudo após a era Presidente Vargas.

Logo após tomar posse, o governador Ruy Lino, acompanhado do seu chefe de Gabinete, Geraldo Brasil e do Deputado Oscar Passos, líder do PTB acreano, apresentou ao Presidente João Goulart a situação reinante entre os funcionários acreanos, conhecidos como extra-numerários mensalistas, que além de não possuírem salário fixo, não usufruíam de direitos a férias, nem a licenças trabalhistas.

Inteirando e sensibilizando o Presidente da República, o governador Ruy Lino  promoveu o enquadramento dos funcionários públicos do Território do Acre, efetivando-os e garantindo-lhes honrosa estabilidade, assegurando-lhes todos os direitos  oferecidos através do Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União (Lei 1711, de 28.10.1952), outorgando-lhes, enfim, dignidade e cidadania, vinculados ao Quadro de Pessoal do Ministério da Justiça e Negócios Interiores.

Não obstante às divergências partidárias, mais intensificadas pelos correligionários apaixonados, a alta cúpula do PTB acreano sempre concordou com o projeto de autonomia do Acre, elevado à categoria de Estado. Haja vista a Ata da Reunião promovida pela Associação Comercial do Acre e Classes Conservadoras, com os Deputados José Guiomard dos Santos e Oscar Passos, sobre o tema. Registre-se, ainda, a entrevista do Governador Ruy Lino ao jornal carioca Correio da Manhã, oito meses antes da sanção da Lei nº4.070, quando o mandatário acreano destacara os esperados benefícios que adviriam com o novo Estado.


Para não fugir às curiosidades do Acre, sua elevação a estado deu-se, justamente, com o beneplácito do Presidente da República, membro do partido opositor ao do autor do projeto, demonstrando respeito ao anseio da maioria dos acreanos. E José Ruy da Silveira Lino, o último governador  fora, em toda a história do Território do Acre, o primeiro e único governador acreano de nascimento.

Em 15 de junho de 1962, finalmente, era sancionada a Lei nº 4.070, que elevara o Território do Acre à categoria de Estado, vindo a revelar o brilho “de um astro em nossa bandeira, que foi tinto no sangue de heróis”.

”Adoremos a estrela altaneira, o mais belo e o melhor dos faróis”, a guiar o único Estado que é brasileiro por opção.

 

F  I  M

terça-feira, 11 de dezembro de 2012


BRASILEIRO POR OPÇÃO-XXV

                    José Augusto de Castro e Costa

 

O desenrolar da vida acreana, no início do século XX, girava em torno da única produção exportável e exclusiva fonte de riqueza, que figurava como dinheiro no ajuste das transações.

Eram assim, os proprietários dos seringais, os verdadeiros magnatas da terra, medindo-lhes a importância pela tonelagem do produto exportado. Seus serviços e suas preferências eram disputados  entre os comerciantes, os profissionais liberais, os intelectuais e  os artesões, que formavam  as sociedades das vilas ribeirinhas, em consequente intercâmbio com os grandes e pequenos seringais.

Todavia, as raízes da riqueza do Acre eram os seringueiros, verdadeiros heróis, modestos e desconhecidos, empenhados em um trabalho desmedido, a demandar muita coragem  e bastante  resistência.

Entre os proprietários acreanos figurara, durante um período curto de  pouco mais de três anos, o coronel José Plácido de Castro, em seu seringal “Capatará”,  que, igualmente ao seringal  Itu,  eram os únicos que apresentavam, em meio a mata sem fim, grandes clareiras de campos naturais, posteriormente transformados em pastagens de engorda do gado procedente da Bolívia, donde chegava depois de imensa e aniquiladora travessia de  floresta virgem.

Consta que, para desbravar o seringal  Itu, seu proprietário, coronel Honório Alves das Neves, ali fizera um grande plantio de macaxeira e, para aproveitá-la, montara um aviamento de fazer farinha.

Havendo por essa ocasião, no Acre, grande falta desse produto, Plácido de Castro sugerira, em carta a Honório, para  fabricar farinha em grande quantidade que ele, Plácido, compraria toda a produção por sessenta mil réis o paneiro de trinta quilos.   Honório respondera ao vizinho que todo o mandiocal ou macaxeiral e a fábrica de aviamento estavam à sua inteira disposição, podendo fazer toda a farinha de que necessitasse, nada lhe custando e, ainda, se alguma coisa lhe sobrasse, ele, Honório, pagaria a sessenta mil réis o paneiro.

A intenção de Plácido de Castro era, aliado ao desejo de fortuna, empreender desenvolvimento ao Acre, levando progresso à parte que lhe coubera.

No período áureo da borracha, era notável a prosperidade e o desenvolvimento urbano de Sena Madureira, Xapurí e Villa Rio Branco.

Plácido de Castro, servira-se da oferta de seu vizinho Honório Alves das Neves, relativo à fabricação de venda de farinha de mandioca, e investira também na aquisição do gado bovino, produto inexistente naquela região, mas que poderia ser comprado na Bolívia.

O Caudilho, não obstante sua luta para expulsar os bolivianos do Acre, mantivera bons relacionamentos com as autoridades e representantes de classes produtoras e conservadoras daquele país, o que o levara a abrir varadouro, rompendo a floresta desde  seu seringal, na margem do rio Acre até às ribanceiras do rio “Madre Dios”, em Riberalta, de onde passara a trazer, depois de compradas, grandes manadas de bois, vacas e bezerros,  para ocupar os dilatados limites de cem quilômetros de fundos do “Capatará”.

A partir daí, a população acreana passara a alimentar-se de carne verde de gado, beber leite fresco, lambuzar bolachas com manteigas também frescas e saciar-se com deliciosas coalhadas e saborosos  queijos.

Todavia, politicamente, os Departamentos acreanos, até 1920, viveram momentos dramáticos de lutas pela criação de um Estado do Acre autônomo, dentro da Federação brasileira.

Nos Departamentos do Alto Purus e Alto Juruá, a insurreição autonomista fizera-se com  maior exaltação, onde destacaram-se as inflamações de  João Bussons, Francisco Freire de Carvalho  e Mâncio Lima, pelo Juruá, distinguindo-se no Alto Purus, Tristão de Alencar Araripe, Antonio Pinto do Areal Souto, Custódio Freire e Flávio Batista.

No Alto Acre o que se desenrolara em proporções extremadas, fora uma preocupante rede de intrigas que se fomentara entre Plácido de Castro e os meios militares, criando injustas rivalidades e ciúmes pueris.

Com a afluência de novos elementos e a fundação de jornais e de lojas maçônicas, intensificaram-se as competições políticas e rivalidades sociais, a que as pessoas eram insensivelmente arrastadas, por influência do meio, ou por simples companheirismo.

O prefeito Gabino Bezouro fora, então, fatalmente induzido a hostilizar o libertador do Acre, o que, de alguma forma, viera surpreender, de vez que as referências davam aquele oficial como pessoa culta, de rígida envergadura moral e homem de honestidade reta.

As qualidades morais de alguns membros que interagiam com Gabino Bezouro, no entanto, pelo fato de constituírem-se do antônimo das referências do prefeito, deixavam muito a desejar, além de perigosas.

Há relatos de que, em 14 de julho  de 1908, chegara à  Empresa, a cavalo,  Genesco de Oliveira Castro, irmão de Plácido de Castro e seu sócio no seringal “Capatará”. Depois de tratar de seus negócios e de jantar no Hotel “24 de Janeiro”, fora dormir em casa do Dr. Leorne Herbster Menescal, ilustre e conceituado médico cearense que ali clinicava.

À meia-noite, fora cercada a casa por uma tropa composta de soldados do exército e de capangas do coronel Alexandrino José da Silva, Subdelegado de polícia, figurando, ainda, na tropa, os tenentes Álvaro Conrado Niemeyer, Figueiredo Aranha e Luiz Sombra.

Sendo preso, Genesco Castro fora levado, altas horas da madrugada, à presença do prefeito Gabino Bezouro, que só achara para dizer-lhe, como justificativa da prisão, que ele entrara na cidade disfarçado, simplesmente porque usava um uniforme “azulão”, que fora adotado pelo exército acreano.

Genesco Castro só não fora desfeiteado na Prefeitura de Empresa, como propusera o tenente Aranha, porque a isso viera a opor-se , decisivamente, Augusto Alves da Silva Bacurau, um bravo e nobre cearense, que então se achara a serviço do Prefeito.

No dia 17 de julho, pela madrugada, um pelotão de praças do exército, comandado pelo tenente Aranha e um grupo de capangas chefiado pelo coronel Alexandrino, atacaram o barracão de José Maria Dias Pereira, no seringal “Riozinho”, que só escapara  porque achara-se ausente.

Em face dessas e outras provocações, Plácido de Castro resolvera armar o pessoal em “Capatará” e em “Bagaço”, fato que viera assustar e apavorar o Prefeito, a ponto de, não obstante ser um coronel do exército brasileiro, encher a casa de gente armada, colocando uma metralhadora em cada porta, para garantir sua segurança.

No dia 8 de agosto, Plácido de Castro dirigira-se à Empresa  para tratar de negócios, inclusive receber cópia do registro do Contrato de compra do seringal “Capatará” e da Declaração da constituição de sua firma.

Durante uma rápida refeição no Hotel “24 de Janeiro”,Plácido fora informado por um dos donos do estabelecimento, Antonio da Silva Rabelo, de que Alexandrino, embriagado, ali estivera em companhia do tenente Luiz  Sombra e de alguns capangas, bradando que “o Prefeito lhe dera carta branca para liquidar  o pai do Acre, contando que fosse fora da cidade”.

Ao meio dia, Alexandrino com seu bando foram vistos retirando-se da Empresa demonstrando  atitudes estranhas.

Á tarde, partiram de regresso Plácido de Castro e seu irmão Genesco, acompanhados do Promotor Público, Dr. Barros Campelo e do advogado José Alves Maia, que foram convidados para repousar nos campos de Esperança, em “Capatará”.

Em vista de seus companheiros não possuírem hábitos de viagem noturna, o grupo decidiu pernoitar em frente ao “Riozinho”, prosseguindo na manhã seguinte, pelo estreito caminho, subindo a margem direita do rio Acre, ligando os seringais “Riozinho”, “Benfica” e “Capatará”.

Logo após atravessarem o igarapé “Distração”, por volta das oito horas da manhã, na altura do  barracão de propriedade de Alexandrino, “Flor de Ouro”, situado à margem esquerda do rio, Plácido defrontara-se com a emboscada, que o aguardava.

Primeiro, dois tiros, um de Mannlicher, outro de Rifle 44, atingiram o Caudilho no braço esquerdo e no dorso, arrebentando-lhe as duas últimas costelas esquerdas, para, em seguida, disparar uma  intensa fuzilaria, mas que não mais o alcançara. Nesse rápido instante, Plácido dissera que pode distinguir Alexandrino, Preto Eugênio e Miguel Mateiro.

Foi em uma rede que Plácido de Castro chegara ao seringal “Benfica”, de João de Oliveira Rôla, onde, apesar de cuidadoso tratamento, viera a falecer às dezesseis horas do dia 11 de agosto de 1908.

Consta que tomaram parte na referida tocaia quatorze pessoas que dali retiraram-se, como fora logo depois verificado, por uma picada que iria sair diante a margem esquerda do rio Acre, em frente ao barracão Flor de Ouro, de Alexandrino. Dentre eles foram reconhecidos Alexandrino José da Silva, Miguel Mateiro, Eugênio França e Luiz Paulo.

Não ocorrera nenhuma prisão, nenhum inquérito, tendo prescrito o nefando assassinato na mais completa impunidade.

Desse vergonhoso desfecho  partiram muitas acusações ao Presidente Afonso Pena, de vez que, quando a imprensa carioca, especificamente o “Correio da Noite”, em verdadeiro clamor, pedia a severa punição dos culpados e exigia o afastamento do prefeito Gabino Bezouro, o “Jornal do Comércio, de 18.9.1908, publicara a seguinte nota: “Estamos autorizados a declarar que o Governo nao chamará o prefeito do Acre a esta capital, porque lhe merece inteira confiança”.

Assim, o coronel Gabino Bezouro continuara intimidando os opositores e forçando grande número de amigos de Plácido de Castro a deixar o Acre, depois de intimados pela vitoriosa e prepotente camarilha do Prefeito.

Em l3 de maio de 1909 o coronel Gabino Bezouro mandara ocupar, sem indenização o campo do seringal Empresa, da firma A.Barros & Cia e ali inaugurara a cidade de “Penápolis”, situada à margem esquerda do rio Acre, defronte à antiga cidade da Empresa.

A 15 de agosto de 1909, Gabino Bezouro passara o cargo de prefeito ao coronel Francisco Simplício Ferreira da Costa, que o apoiara, com gente armada, por ocasião dos trágicos dias de setembro de 1908.

BRASILEIRO POR OPÇÃO-XXIV

                      José Augusto de Castro e Costa

 

Através o Relatório da Comissão Mista Brasileiro-Peruana, Euclides da Cunha, a serviço

O Tratado de Petrópolis, em princípio, constituíra-se na primeira solução de uma contenda diplomática, a qual ainda requereria efetuar outros ajustes em relação ao  Acre, que envolviam também o Peru, além da Bolívia.

Tratava-se de desarmonia  havida entre os dois países, tendo justamente o Alto-Purus  e o Alto-Juruá na pauta das discussões da área acreana, o que levara o Barão do Rio Branco a aprofundar-se nas negociações, objetivando  dispositivos harmoniosos que chegassem  aos  completos entendimentos entre Bolívia, Peru e Brasil. da Comissão de Limites do Brasil, prestara grande contribuição para solidificar os conhecimentos do Barão do Rio Branco sobre a região litigiosa e a consequente elaboração dos seus  fundamentos,  ao assinalar que, “... partindo da foz do Purus e percorrendo uma distância de 1.417 milhas ou cerca de 400 léguas, tem-se a prova tangível de que  quatro quintos do majestoso rio estão completamente povoados de brasileiros, sem um hiato, sem a menor falha de uma área em abandono, ligados as extremas de todos os seringais -, estirando-se unida por toda aquela lonjura, que lhe define geometricamente a grandeza, uma sociedade rude porventura ainda, mas vigorosa e triunfante”.

Seis anos após a elaboração do documento de Petrópolis, com a data de 08.9.1909 seria finalmente assinado o “Tratado entre o Brasil e o Peru, completando a determinação das fronteiras entre os dois países e estabelecendo princípios gerais sobre o seu comércio e navegação na bacia do Amazonas”.

Estando o Acre, no princípio de 1904, legalmente integrado na Federação brasileira, Plácido de Castro sentindo-se no dever de prestar contas de sua atuação na campanha, ao chanceler Barão do Rio Branco, dirigira-se à capital da República.

No dia 23 de abril, ao aportar o navio ao Cais Pharoux, no Rio de Janeiro, o Caudilho fora recebido e passara a  ser alvo de  homenagens de todos os ministros de Estado, dos membros das Comissões do Senado e da Câmara Federal, do presidente da Associação Comercial, da imprensa, dos estudantes e do próprio Barão do Rio Branco, por sinal, o primeiro a apertar-lhe as mãos, salientando que sua bravura  cimentara os alicerces do Tratado de Petrópolis. Segundo jornais da época, os brados de exaltação a Plácido ressoaram por toda a Praça XV, sem interrupção, à medida em que o cortejo movimentava-se lentamente, sob a ovação popular.

O Território do Acre, após o Tratado de Petrópolis, ficara dividido em três Departamentos administrativos: O Departamento do Alto Acre, o Departamento do Alto Purus e o Departamento do Alto Juruá, criando-se, posteriormente, o Departamento do Tarauacá. Os Departamentos eram administrados por Prefeitos de livre escolha e nomeação do Presidente da República. Suas administrações eram amplas e abrangentes, destacando-se as relacionadas à administração rotineira e a segurança pública. As questões atribuídas à Justiça cível e criminal  ficavam ao encargo dos juízes de Direito, juiz de Comarca e ao júri.

Em junho de 1904, Plácido de Castro fora empossado Prefeito do Alto Acre, vindo a ser substituído, posteriormente, em razão de intrigas e disputas políticas com as oligarquias locais, figurando como principais adversários o prefeito substituto, coronel Gabino Bezouro e o delegado de polícia, seu ex-companheiro revolucionário, Alexandrino José da Silva.  

Plácido de Castro, depois de viajar ao sul do país, em visita aos seus familiares, adquirira novo ânimo e decidira retornar ao Acre, desta vez, porém, em busca de fortuna.

Por sua própria deliberação integrara-se o Caudilho, na atividade industrial do extrativismo da borracha, na terra que aprendera a amar e a elegera como seu lar.     

 O Caudilho adquirira legalmente, a crédito de uma firma de Belém, no valor de cento e vinte contos de réis, pagáveis a longo prazo, o seringal “Capatará”, localizado a algumas milhas acima da “Volta da Empresa”, que passara a denominar-se “Vila Rio Branco”.


 

 

Durante uma viagem ao Rio de Janeiro, Plácido tivera por companheiro o escritor Euclides da Cunha, o qual o incentivara a escrever e publicar seus apontamentos sobre a Revolução Acreana.

Aquele escritor tinha a pretensão de ocupar-se dos sucessos que trouxeram o Acre para o Brasil, e Plácido, a título de contribuição, forneceu seus apontamentos que estenderam-se desde junho de 1902, quando achava-se no “Território de Colônias, da Bolívia, demarcando o seringal “Victória”, de José Galdino, até quando publicou a ordem do dia, dissolvendo o Exército acreano, em vista do general brasileiro ter invadido o Acre Meridional e assumido clandestinamente o seu governo, que não estava acéfalo.

Ao retornar, Plácido de Castro encontrara o Acre em ebulição, com as autoridades federais do exército temendo as ideias políticas dos que pleiteavam perante o Congresso Nacional a criação do Estado do Acre. Eram distribuídas sentinelas, postadas nas curvas do rio e na boca dos varadouros. A instabilidade dessas turbulências políticas eram sentidas nos três Departamentos.

O temor de oposição ou de deposição, que em referência aos chefes acreanos manifestavam os prefeitos para ali enviados, constituía uma verdadeira psicose, proveniente talvez de ambiciosos planos acariciados, agravada de certo pela estranheza do ambiente e pelo pavor de adoecer e sabidamente alimentada e usufruída pela corja de intrigantes e exploradores que os seguia ou os cercava.

Confirmando a regra que se vinha estabelecendo, ao assumir a Prefeitura do Alto Acre, o coronel Gabino Bezouro tomara-se de receios da influência política do coronel José Plácido de Castro, que outra coisa não desejava  senão, na companhia de seu irmão Genesco  Castro,  a tranquila exploração de seu seringal Capatará e dos campos de criação de Esperança, mas que se tornara, naturalmente, por sua bravura e lealdade, o intérprete das queixas do povo acreano contra lesivos abusos praticados pelas autoridades arbitrárias, que iam desfrutar o degradado território.

O novo Prefeito fora, assim, fatalmente induzido a hostilizar o libertador do Acre, envolto  em intrigas e prevenções, estabelecendo-se logo as primeiras escaramuças.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                        

 

 

 

 

 

 

 

 

sexta-feira, 30 de novembro de 2012


Assunto: ENC: Enc: JORJÃO E A LEI MARIA DA PENHA..

 



 

 

 

 

   

 

    Se havia algo que deixava o delegado Carlos Henrique consternado era choro de mulher. Ainda mais quando ela tinha 30 anos, era bonita e sensual:

    - Mas, o que foi que aconteceu, meu anjo? Conta pra mim... Maristela - esse o nome da vítima - fez beicinho:

    - Ele me bateu!!!....... Dr. Carlos Henrique trincou os dentes:

    - Ele, quem?

    - O Jorjão! ( Ele sentiu o peito arfar:)

    - E quem é esse Jorjão?

    - É... Bem, como eu posso dizer? Ah, deixa pra lá, doutor. Acho melhor não registrar nada.  Dr. Carlos Henrique pousou a mão naquele ombro macio, carnudo:

    - Posso lhe dizer uma coisa? (Maristela ficou em silêncio). O delegado insistiu:

    - Com toda a experiência que tenho nesses casos? Ela balançou a cabeça, afirmativamente:

    - Pode!

    - Se você não denunciar esse patife, ele vai te bater de novo. Ela abriu o olho roxo:

    - O senhor acha?

    - Tenho certeza, meu doce... Alisou o hematoma:

    - Aliás, vou expedir uma guia para o Instituto Médico-Legal fazer o exame de corpo de delito. Está horrível... Apesar dos pesares, ela sorriu:

    - O senhor ainda não viu nada.

    - Ele fez pior ainda? Maristela pôs a mão na coxa:

    - Me deu um chute aqui... - Ficou a marca?

    - Uma mancha enorme.

    - Entre aqui no meu gabinete, que eu quero ver.

    - Então, feche a porta, doutor. Dr. Carlos Henrique deu três voltas com a chave e mais quatro com o ferrolho. Tapou o buraco da fechadura com uma fita adesiva:

    - Assim está bom?

    - Ótimo. Agora, ligue o ar e prepare uma bebida para nós dois.

    - Vinho? Maristela mordeu o lábio ferido e exigiu:

    - Se tiver uísque, eu prefiro.

    - Tenho sempre um litro guardado para essas emergências, meu anjo. Puro ou com gelo?

    - Puro. O delegado serviu duas doses. Maristela pegou a sua e bebeu tudo em apenas três goles. Estalou os beiços:

    - Vou tirar a roupa.

    - Mostra tudo, meu doce. Quero ver todos os hematomas.

    - Apague aquela luz ali. Deixa só a do corredor... Dr. Carlos Henrique estava arrepiado: 

    - Isto aqui tá parecendo estúdio da Playboy... Tira tudo, meu anjo, tira.

    - Tô tirando... Pronto! O delegado, nervoso:

    - Preciso acender. Quero ver de perto para poder descrever nos autos...

    - Epa!!!!

    - O que foi, doutor?

    - VOCê é HOMEM, CARA !!!!

    - POIS é DOUTOR, É COM ISSO QUE O JORJÃO NÃO SE CONFORMA!

 

 

 

 

 

sexta-feira, 16 de novembro de 2012


BRASILEIRO POR OPÇÃO-XXIII

                      José Augusto de Castro e Costa

 

O  então  novo programa do governo brasileiro trouxera, nos idos de 1903, novas e esperançosas perspectivas aos revolucionários acreanos, para quem havia justificativa de  sonhar que “o sol da liberdade em raios fúlgidos brilhou no céu da pátria nesse instante”.

No que tange ao Barão do Rio Branco, o mundo o vira dar nova orientação à política exterior do Brasil, o que o levara  a elaborar o famoso Tratado, destinado a  dirimir a secular contenda de limites com a Bolívia.

Quando  o Ministro José Maria da Silva Paranhos Junior assumiu a direção da política exterior brasileira, a luta, a qual os antecessores do eminente chanceler, por pura displicência, haviam  posto como encerrada, atingira a sua fase máxima, num conflito que chegara às proporções de uma guerra, cuja gravidade o governo do Brasil não poderia ficar alheio, no interesse da paz sul-americana. O ponto preocupante era, indubitavelmente, o arrendamento feito ao Bolivian Syndicate of New York, em cuja imensidão encontrava-se a zona mais rica, mais próspera e mais produtiva, que o destemor do acreano  povoara, civilizara e explorara, há muitos e muitos anos, até 1897, mansa e pacificamente.

Ao  dedicar-se à solução da questão do Acre, o Barão do Rio Branco sempre estivera ciente de que seu empenho não resumia-se apenas à Bolívia mas, sobremaneira à oposição política brasileira, onde o conflito de ideias refletia características de formação intelectual diversificada, destacando-se de um lado a ótica jurídica e de outro a social e patriótica, ou seja, o espírito do Direito versus o da Diplomacia, com a torcida das conveniências imediatistas.

Envolvido nesse clima, Barão do Rio Branco, em perfeita sintonia com o embaixador brasileiro em Washington, Assis Brasil, estudara com profundidade os antecedentes históricos, com a visão aguda dos fatos e deduzira que, na questão em apreço, sua preferência seria pelo acordo direto, o que resolveria as dificuldades presentes. Nascera dessa deliberação, o instrumento diplomático denominado Tratado de Petrópolis.

Para o Barão do Rio Branco e o Embaixador Assis Brasil, era preciso a todo custo que o Acre fosse, o mais rápido possível, incorporado ao Brasil. A questão acreana não era, para eles, uma questão amazônica, mas, sem dúvida, uma questão brasileira. E o mais importante, para a busca da solução, era o apoio e a dedicação do Presidente Rodrigues Alves, que expressava ponderações sobre a conveniência de abreviar-se  o ajuste do Tratado ao exame do Legislativo brasileiro.

Em correspondência ao Barão do Rio Branco, o Embaixador Assis Brasil expressara-se textualmente:” Aproveito o fato de lhe estar escrevendo privadamente para submeter a V.Exª uma cogitação que muito me tem ocupado relativamente ao Acre. Espero que V.Exª estará firme na resolução de não mais deixar esse território sair do nosso domínio. Vai, porém entregá-lo à discutível competência da politicagem do Amazonas ou do Mato Grosso? Por que não usa do seu grande prestígio nacional para promover a reforma que estabelece o regime dos territórios? Seria uma bênção para o País. Como acabar por outro modo com as imoralidades do Amazonas, por exemplo, que ainda neste momento está procurando hipotecer aos agiotas mais direitos soberanos que a Bolívia quis dar ao Sindicato do Acre? E que melhor campeão teriam esses ricos territórios que o herói incruento que os conquistou para o patrimônio nacional?”

Os revolucionários acreanos também fizeram sistemática oposição à ideia dos políticos de Manaus de anexar o Acre ao Amazonas, apropriando-se todos das palavras de Plácido de Castro de que “o Acre não será agrilhoado à triste sorte do Amazonas, porque nós, acreanos, não queremos”.

Ao  fundamentar justificativas ante aos mais virulentos ataques da oposição política, Barão do Rio Branco empenhara-se em revelar inúmeros precedentes históricos de cessões, permutas e vendas de territórios, levados a efeitos mundo afora, celebrados por potências europeias, tornando-se prática usual estendida ao Novo Mundo, a exemplo de vários tratados celebrados pela República dos Estados Unidos da América, que conseguiu adquirir, por compra, a maior parte do território que hoje possui.

A título de exemplo, Barão do Rio Branco citara o Tratado de Paris,de 30.04.1803 durante a presidência de Thomas Jefferson, estipulando a venda aos EE.UU., pelo governo de Napoleão Bonaparte, da Luisiana, cuja população branca era totalmente de origem francesa.

Durante o governo de James Moore, através do Tratado de 22.02.1819, os EE.UU. adquiriram a Flórida Oriental e a Flórida Ocidental. Inúmeros outros Presidentes americanos, a seguir, tais como James Polk, em 1846, Franklin Pierce, em 1853, Andrew Johnson, em 1867, Mackinley através do Tratado de Paz, com a Espanha, em 1898, promoveram a celebração de Tratados, a fim de adquirir territórios para anexá-los  à soberania americana.

Para o Barão do Rio Branco e os mais abalizados estudiosos do Direito Internacional, o Tratado de Petrópolis, foi, em linhas gerais, uma consequência jurídica do Tratado de Ayacucho, de 1867, o qual estipulava que a execução daquele acordo dependia da demarcação que se mandaria proceder conjuntamente, o que nunca ocorrera, por displicência do governo brasileiro.

E em 17 de novembro de 1903, seria finalmente assinado o Tratado de Petrópolis, considerado um importante tratado internacional, pondo  fim às lutas que somente extinguiram-se graças à bravura dos acreanos, ao espírito guerreiro do coronel José Plácido de Castro e à proficiência do ministro plenipotenciário brasileiro José Maria da Silva Paranhos.

Plácido de Castro e Barão do Rio Branco, completam-se na História do Acre. Enquanto este  foi o amparo jurídico dos heróis acreanos, numa ânsia generosa de reparação e justiça, que lhes eram devidas, aquele foi o combatente sem trégua, o auxiliar primacial da grande conquista nacional.

O Brasil deve a Plácido de Castro e ao Barão do Rio Branco, a incorporação do território acreano ao patrimônio Nacional.

Com efeito, torna-se justo todo acreano ufanar-se com o pacto entre brasileiros e bolivianos, no qual não houve vencedores nem vencidos, mas a remoção, para sempre, de dificuldades e complicações, culminando com a conciliação de interesses bem entendidos, não obstante o derramamento de sangue, de dois irmãos vizinhos e amigos.

Um tributo ao Tratado de Petrópolis!

Uma homenagem ao  17 de Novembro!

 

 

 

terça-feira, 13 de novembro de 2012


BRASILEIRO POR OPÇÃO-XXII

                    José Augusto de Castro e Costa

 

Plácido de Castro, ao longo do mês de abril de 1903, passara a sentir-se incomodado ante as notícias de estranhos acontecimentos que vinham-se seguindo, o que, por certo, agravariam a conotação de seus maus pressentimentos.

Toda espécie de picuinhas e perseguições o Caudilho vira mover-se contra ele, oriundas de alguns de seus próprios patrícios e de graduados  militares do Batalhão do Exército.

Numa tarde da primeira quinzena de maio, ao chegar ao seringal “Iracema” com seus fiéis  soldados, Plácido se propusera a tomar, juntamente com os seus companheiros, o destino que a situação excepcional o aconselhasse, convicto, porém, de que “quem se tinha assim sacrificado pela Pátria, jamais se deixaria enxovalhar”.

Plácido de Castro sentira o momento de filosofar sobre as circunstâncias que o Acre passara  a vivenciar, assistindo o  representante militar do governo brasileiro transgredir  os limites da missão que lhe fora traçada, vendo a ocupação do Acre Setentrional  e a invasão do Acre Meridional, sentindo a prisão com brutalidade do ajudante-general  do Exército Acreano e demais soldados, sendo informado da posse violenta e confisco do “Independência” e de milhares de mercadorias, móveis e utensílios...Um turbilhão de fatos negativos aos propósitos do Caudilho tomavam corpo e tumultuavam suas perspectivas.

Precisamente  no dia 12 de maio, Plácido de Castro fora avisado da chegada ao porto do “Iracema”, local em que  se  encontrava no momento, de uma lancha do Quartel-General  do exército brasileiro, trazendo um emissário que viera convocá-lo para uma conferência com o General Olímpio da Silveira.

Plácido, com inabalável solicitude, respondera, mandando dizer ao General que a tal conferência não teria  mais sentido, em face de haver decidido que, a partir daquele momento, sua carreira militar e política estaria encerrada, com sua forçada deposição. Portanto, de posse da convocação do General, não aceitaria a conferência e nem se deixaria desfeitear.

Após a partida da lancha do Quartel-General, o Caudilho  recolhera-se para redigir a Ordem do Dia, com a qual, dirigindo-se aos que tiveram a nobreza para enfrentar todos os sofrimentos com constância e altivez, relatara os últimos acontecimentos vivenciados desde a chegada do Exército Nacional e deliberara dissolver o Exército Acreano, encerrando o expediente  com a afirmação de que “aquilo que o inimigo não conseguiu fazer pelas armas, o general brasileiro alcançou pela traição.

E os nossos algozes são aqueles que oficialmente estão incumbidos de zelar pela nossa liberdade e pela honra da Pátria”.

Ao redigir a Ordem do Dia, Plácido refletira que bem poderia resistir àquela perturbação desenfreada, àquela anarquia que somente se justificaria pela insanidade, pela prepotência, pelo desequilíbrio emocional.

O bom senso e equilíbrio do Caudilho, porém, o detiveram de uma reação violenta contra as forças de sua própria pátria, conduta que o conduzira a protestar contra o atentado inominável e retirar-se altivamente do território, para levar, pessoalmente, suas reclamações ao governo federal. E assim o fizera.

Com a divulgação dos recentes acontecimentos e graça a essa providencia, Plácido fora nacionalmente aclamado, em delirantes manifestações de reconhecimento e entusiasmo patriótico, tanto em Manaus quanto no Rio de Janeiro. Por extensão, o governo federal  acolhera-o condignamente, oferecendo-lhe completas satisfações e determinando seu retorno para o Acre Meridional, em caráter oficial.

Em consequência das tresloucadas atitudes, o general Olímpio da Silveira sofrera demissão e fora severamente censurado  “pela autoria do delito de assaltar uma praça de guerra livre, onde o Brasil não tinha soberania e sim intervenção diplomática”.

Para substituir o autoritário e desequilibrado oficial, fora nomeado o Coronel Rafael Augusto da Cunha Matos, a quem foram transmitidas ordens terminantes de, em Ordem do Dia, protestar “contra o ato inoportuno e impolítico de seu antecessor”, e  de reparar tudo, inclusive a reorganização do exército acreano desbaratado.

Após aguardar o desenrolar dos acontecimentos em Manaus, onde permanecera por três meses, Plácido de Castro conferenciara  com o novo Comandante do 1º Distrito Militar de Manaus, general Luis Antonio de Medeiros, ocasião em que tomara conhecimento e entrosara-se com o esquema da nova  política brasileira, ênfase do programa de governo  do  Presidente Rodrigues Alves.

O Caudilho da revolução acreana sentira bastante com a humilhação sofrida na desavença com o general-comandante da Expedição Norte, razão pela qual confiara na reparação que os telegramas recebidos do Ministério do Exterior lhe anunciavam.

Durante os contatos mantidos com as autoridades militares sediadas em Manaus, o chefe revolucionário acreano inteirara-se do desenrolar dos últimos acontecimentos relacionados à região acreana e, enfim  prestigiado, sentira-se glorificado e de alma lavada e enlevada  com  a publicação do Decreto nº 1, do Comando Militar Interino do Acre Setentrional  e  Comando em Chefe das Forças de Ocupação, nos seguintes termos:

 

 

“Governo Militar Interino do Acre Setentrional e Comando em Chefe das Forças de Ocupação. Quartel-General na Praça da Empresa, 3 de agosto de 1903.

DECRETO N° 1

O coronel Rafael Augusto da Cunha Matos, governador Militar e comandante-em chefe,

CONSIDERANDO que o ato do seu ilustre antecessor, o General-de-Divisão Antonio Olímpio da Silveira, desarmando e licenciando as forças acreanas que sob o comando do Sr. Coronel Plácido de Castro ocupavam militarmente o Território Meridional, foi antipolítico, menos conveniente e inoportuno;

CONSIDERANDO também que a apreensão de artigos bélicos, material flutuante e gêneros alimentícios pertencentes às mesmas Forças que os adquiriram com os sacrifícios de preciosas vidas de centenas de valentes brasileiros tombados em mais de uma ação de combates travados em defesa do solo nacional, foi indevida;

CONSIDERANDO finalmente que não podem nem devem continuar de pé as aludidas deliberações,

RESOLVE:

Chamar às armas as Forças dissolvidas que deverão as apresentar aos respectivos chefes. Restituir às mesmas Forças o que indevidamente foi apreendido e finalmente, reconhecer e manter no governo do Território Meridional do Acre e no Comando em Chefe das mesmas Forças Acreanas, o Sr. Coronel Plácido de Castro.

                                                           Rafael Augusto da Cunha Matos

                                                                       Coronel Governador.

Em face da campanha acreana, Plácido de Castro encontrara a prova de reconhecimento dos brasileiros, vindo através de manifestações generalizadas das classes conservadoras, da Imprensa, das Forças Armadas, do governo, do clero, do povo, destacando-se discursos inflamados de entusiasmo em festa cívica no Teatro Amazonas, estendendo-se até a sermão solene em Missa campal.

No final  de agosto de 1903 o Caudilho, certificado pelo novo comandante local acerca da  indenização dos prejuízos causados pela captura dos bens materiais e provisões de sua força revolucionária e, ainda, recuperado de todos os seus títulos e prerrogativas, retornara  à região acreana, oficialmente, na qualidade de governador do Acre Meridional - ou do Estado Independente do Acre.

O  panorama político tranquilizara-se porque o Brasil, com a posse do novo presidente Rodrigues Alves, passara a adotar uma avançada mentalidade em  seu programa de governo, instaurando uma política destinada a fomentar o pleno desenvolvimento de todas as potencialidades do país, tais como a balança comercial, os meios de transportes, a saúde, a educação, a transformação do velho Rio de Janeiro numa das mais belas metrópoles  do continente e também a diplomacia, onde se destacaria a figura de José Maria da Silva Paranhos – Barão do Rio Branco.

Aos cinquenta e oito anos de idade, o Barão do Rio Branco já acumulara em sua bagagem, uma inestimável folha de serviços prestados diretamente à diplomacia brasileira, onde destacaram-se o desempenho rotineiro de suas funções pacíficas exercidas nos movimentados postos dos Continentes americano e europeu, até a admirável habilidade para vencer as encrencadas complicações de Missões, no Rio Grande do Sul e do Amapá, no extremo  norte do Brasil.